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Cada vez mais preciso dos silêncios. Há muitos diálogos na minha mente, não consigo ouvir o que está fora.
Eu costumava buscar companhias , sorrir mesmo que sem querer, falar pelos meus cotovelos ideias mirabolantes e comédias do dia dia.
Hoje fico muda, tentando acalmar meus barulhos ensurdecedores, numa estrada sem fim para buscar a paz que perdi.
Enquanto minha mente não cala, não posso ouvir mais nada, não tenho vontade de rir ou de chorar, somente contemplo o caos na esperança de que eu possa mudar algo em um click.
Me sinto engolida pelas narrativas que tolerei, mal compreendida, interpretada ao razo, sem tem certeza do que é real e do que é berro.
Faz calor em Shanghai, um calor insuportável, que me lota, que me tonteia. Espero a chuva todos os dias para buscar um ar fresco e só ouço os trovões, mas não vejo a água.
Bagagens pesam, isso é um fato. Pesam em você e pesam em mim.
A gente não se livra delas, a gente as carrega, às vezes mais cansados, às vezes menos. Carregamos buscando que alguém chegue e nos ajude, pegando uma alça ou outra, ou carregamos sós achando que ninguém poderá ajudar a carregar.
Acho que a magia de um bom relacionamento, aquele que a gente sabe que vai crescer e durar, é quando a pessoa faz com que a gente sinta que a nossa bagagem não é tão pesada assim. Seja porque vai nos ajudar a carregá-la, seja porque olha para nós e diz: "Nem é tão grande, você só está carregando por tempo demais!".
Eu tenho medo das minhas bagagens. Se eu pudesse traduzir o que imagino delas em um objeto certamente seria um container de navio, cheio de malas sem alça, com zíper arrebentando, preenchidas com chumbo. Eu fico nessa certeza de que ninguém vai conseguir me ajudar a carregar, não é dever do outro isso. Tento esconder o container com o meu próprio corpo mas ele tá lá, enorme, preenchido e presente.
Às vezes você me olha e o container parece sumir, se transformar numa pequena maletinha. Eu vou, o invoco de novo na esperança de que você saia correndo. E você sorri, olha de novo e aponta com o dedo: "É uma maletinha!".
Vai entender...
Você fotografa os reflexos nas poças
E eu, sem perceber
Queimo meu filme te olhando com cara de boba
Você diz que quer fazer planos comigo
E eu, aflita, te olho nos olhos
Ainda tonta de tantas curvas
Pergunto se você tem certeza
Você me abraça
Desfaz sua voz sempre suave
E, firme, me responde que sim
Colando meu corpo no seu
Tirando todo o peso dos meus ombros
Suas mechas desbotadas azuis
Com os reflexos laranjas do meu cabelo
Fazendo uma paleta holywoodiana clichê
Tão clichê quanto sexo embaixo de dossel
Ou fazer planos para a eternidade
Tipo de cafonice que eu gosto
Quando você sai fica esse cheiro no travesseiro
O meu sorriso no rosto
E essa vontade imensa de escrever
Suspiro na fronha 100% poliéster
Sorrio de doer as covinhas
Meus dedos pulam como pulgas no teclado
Volte sempre!
Tenho um sonho frequente. Quase toda semana eu sonho que dou a luz a uma criança antes da hora, muito pequena e frágil. Um bebê do tamanho de uma mão e aparência prematura.
Eu tento amamentá-lo sempre mas nunca funciona. Até que chega uma hora que ele some e eu saio procurando-o entre a bagunça. Vou perguntando aos meus familiares onde ele está, alerto que é um bebê muito frágil, mas todos ignoram, como se eu tivesse alucinando ou como se não ligassem para a minha aflição.
O bebê nunca tem pai. Eventualmente figuras do meu passado aparecem no sonho e eu as encontro sabendo que não são o pai. E também não me ajudam a procurar, nem ao menos ficam comovidos com o meu desespero.
Às vezes eu encontro o bebê no meio da bagunça, quase morto. Às vezes o sonho termina antes.
Os berros eram o que mais me assustava
Seu grito na minha cara
Soprando, perto da minha pele
O som do impacto das coisas no chão
Eu não gosto muito de barulho
Ainda consigo sentir o desconforto no ouvido
A forma como o prédio parecia tremer
E a sensação de "causa perdida"
Mas a memória da vontade cega de ainda seguir
Pisando em ovos, desviando de porcelanas
Logo eu que sou tão estabanada
Meu direito de existir terminava com a sua vontade de me encolher
Os sons reverberavam e batiam nas paredes que eram pra ser de amor
Imersa do estrondo da sua raiva, eu me sentia um defunto de tão fraca
E ainda vivo luto de uma parte minha que morreu
Às vezes fico na dúvida
Se gosto menos ou se gosto mais
Suspiro confortável:
Acho que gosto melhor
Acho que gosto de você
Gosto como você fala baixo, ajeita o cabelo atrás da orelha e me olha com seus olhos de Beatle idealista
Gosto da cor chumbo do seu cabelo, quando passa nos meus dedos, dançando entre as mechas azuis que você nunca retocou
Gosto como sempre você tira os óculos antes de me agarrar
Gosto de sentir você em mim enquanto olha nos meus olhos e fala baixo no meu ouvido: "Gostosa!"
Gosto como os nossos corpos se complementam em um ritmo único quando isso acontece
Gosto do jeito que você acredita que vai mudar o mundo, viajar para todos os cantos ou fotografar no Tibete um dia
Gosto de olhar suas fotos na parede da sala e acreditar nisso
Gosto como as luzes do Largo dos Leões iluminam a calçada em dourado no sol da manhã, assim que saio da sua casa (a pé, pra sorrir por mais tempo depois de te encontrar)
Os ventos que batem nas árvores ao lado da minha janela fazem o mesmo som que as ondas do mar.
Eu adoro tempestades e fortes ventanias mas sempre tive muito medo do mar.
Várias vezes me senti uma filha fajuta de Iemanjá.
Mas toda vez que venta aqui, na lateral da janela, é como se eu estivesse na casa dela.
Meus marinheiros são desbravadores de ventanias. Minhas ondas são galhos dançantes. A espuma se faz em cada folha que cai.
Sou uma pirata da terra firme.