segunda-feira, 25 de outubro de 2021

Devaneios sobre bagagens

Bagagens pesam, isso é um fato. Pesam em você e pesam em mim.

A gente não se livra delas, a gente as carrega, às vezes mais cansados, às vezes menos. Carregamos buscando que alguém chegue e nos ajude, pegando uma alça ou outra, ou carregamos sós achando que ninguém poderá ajudar a carregar.

Acho que a magia de um bom relacionamento, aquele que a gente sabe que vai crescer e durar, é quando a pessoa faz com que a gente sinta que a nossa bagagem não é tão pesada assim. Seja porque vai nos ajudar a carregá-la, seja porque olha para nós e diz: "Nem é tão grande, você só está carregando por tempo demais!".

Eu tenho medo das minhas bagagens. Se eu pudesse traduzir o que imagino delas em um objeto certamente seria um container de navio, cheio de malas sem alça, com zíper arrebentando, preenchidas com chumbo. Eu fico nessa certeza de que ninguém vai conseguir me ajudar a carregar, não é dever do outro isso. Tento esconder o container com o meu próprio corpo mas ele tá lá, enorme, preenchido e presente.

Às vezes você me olha e o container parece sumir, se transformar numa pequena maletinha. Eu vou, o invoco de novo na esperança de que você saia correndo. E você sorri, olha de novo e aponta com o dedo: "É uma maletinha!".

Vai entender...

quarta-feira, 13 de outubro de 2021

Delírios imobilários no Ella

Eu não sei se quero varandas
Janelas de madeira
Talvez um segundo quarto
Iluminação pela manhã tem que ter
Casa com cara de casa
Com paredes brancas
Algum lugar que as gatas possam pegar sol
Gosto mais de piso quente
E silêncio é fundamental

Logo perco o foco
Imagino nossos quadros juntos
Uma pilha de vinis
Cafeteiras maiores para as manhãs
Na sua casa dá, na minha não
Eu já tenho geladeira
Você tem o armário
As duas máquinas de lavar são boas
Finalmente vou me livrar do meu sofá?

Me silencio
Tá cedo demais
Tento segurar meus delírios 
E você me indaga na pizzaria
Como quem sabe o que eu estou pensando
Fala que "até lá a gente tá morando junto"
Eu rio, fico vermelha
Você ri, como quem tira sarro:
"Toda brincadeira tem um fundo de verdade"


(é doido que nem eu. babou.)

terça-feira, 5 de outubro de 2021

Cenas de Paraty 2

Você fotografa os reflexos nas poças
E eu, sem perceber
Queimo meu filme te olhando com cara de boba

Cenas de Paraty

Você diz que quer fazer planos comigo
E eu, aflita, te olho nos olhos
Ainda tonta de tantas curvas
Pergunto se você tem certeza

Você me abraça
Desfaz sua voz sempre suave
E, firme, me responde que sim
Colando meu corpo no seu 
Tirando todo o peso dos meus ombros

Kakalula

Suas mechas desbotadas azuis
Com os reflexos laranjas do meu cabelo
Fazendo uma paleta holywoodiana clichê
Tão clichê quanto sexo embaixo de dossel
Ou fazer planos para a eternidade

Tipo de cafonice que eu gosto

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Depois que você chama o elevador

Quando você sai fica esse cheiro no travesseiro
O meu sorriso no rosto
E essa vontade imensa de escrever

Suspiro na fronha 100% poliéster
Sorrio de doer as covinhas
Meus dedos pulam como pulgas no teclado

Volte sempre!

sexta-feira, 17 de setembro de 2021

Valsa na Exposição

Dou dois passos para trás, como quem dança uma valsa
Para te olhar ali, concentrado
Te observar, sem que você perceba meu encantamento

Dou dois passos pra frente, retorno ao seu lado
Faço um comentário sobre a luz, a cor, o ângulo
"Gosto como a sombra ficou nessa aqui!"

Dou dois passos para trás, fujo da sua vista novamente
Te flagro com os olhos semicerrados, lábios pressionados
"Será que ele tá livre na terça?"

Dou dois passos pra frente, você me surpreende:
Dá dois passos pra trás, me abraça pelas costas
E eu, discreta, sorrio como quem olha para uma moldura vazia

segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Com calma

Encantada aos pouquinhos

Leve e suave como sua voz baixinha

O sonho do bebê

Tenho um sonho frequente. Quase toda semana eu sonho que dou a luz a uma criança antes da hora, muito pequena e frágil. Um bebê do tamanho de uma mão e aparência prematura.

Eu tento amamentá-lo sempre mas nunca funciona. Até que chega uma hora que ele some e eu saio procurando-o entre a bagunça. Vou perguntando aos meus familiares onde ele está, alerto que é um bebê muito frágil, mas todos ignoram, como se eu tivesse alucinando ou como se não ligassem para a minha aflição.

O bebê nunca tem pai. Eventualmente figuras do meu passado aparecem no sonho e eu as encontro sabendo que não são o pai. E também não me ajudam a procurar, nem ao menos ficam comovidos com o meu desespero.

Às vezes eu encontro o bebê no meio da bagunça, quase morto. Às vezes o sonho termina antes.

Para onde?



Eu sou extremamente cafona

Meu Uber agora sugere seu endereço e eu achei isso um máximo.

Medo de mar

Medo de (a)mar


Medo geral do que me foge ao controle

Medo de mergulhar nas minhas profundezas e nunca mais voltar

Brado

Os berros eram o que mais me assustava

Seu grito na minha cara

Soprando, perto da minha pele

O som do impacto das coisas no chão

Eu não gosto muito de barulho


Ainda consigo sentir o desconforto no ouvido

A forma como o prédio parecia tremer

E a sensação de "causa perdida"

Mas a memória da vontade cega de ainda seguir

Pisando em ovos, desviando de porcelanas

Logo eu que sou tão estabanada


Meu direito de existir terminava com a sua vontade de me encolher 

Os sons reverberavam e batiam nas paredes que eram pra ser de amor

Imersa do estrondo da sua raiva, eu me sentia um defunto de tão fraca

E ainda vivo luto de uma parte minha que morreu


Pequena nota de segunda

Às vezes fico na dúvida

Se gosto menos ou se gosto mais

Suspiro confortável:

Acho que gosto melhor

quinta-feira, 9 de setembro de 2021

Largo dos Leões

Acho que gosto de você

Gosto como você fala baixo, ajeita o cabelo atrás da orelha e me olha com seus olhos de Beatle idealista

Gosto da cor chumbo do seu cabelo, quando passa nos meus dedos, dançando entre as mechas azuis que você nunca retocou

Gosto como sempre você tira os óculos antes de me agarrar

Gosto de sentir você em mim enquanto olha nos meus olhos e fala baixo no meu ouvido: "Gostosa!"

Gosto como os nossos corpos se complementam em um ritmo único quando isso acontece

Gosto do jeito que você acredita que vai mudar o mundo, viajar para todos os cantos ou fotografar no Tibete um dia

Gosto de olhar suas fotos na parede da sala e acreditar nisso

Gosto como as luzes do Largo dos Leões iluminam a calçada em dourado no sol da manhã, assim que saio da sua casa (a pé, pra sorrir por mais tempo depois de te encontrar)

sábado, 7 de agosto de 2021

A-hoy!

Os ventos que batem nas árvores ao lado da minha janela fazem o mesmo som que as ondas do mar.

Eu adoro tempestades e fortes ventanias mas sempre tive muito medo do mar.

Várias vezes me senti uma filha fajuta de Iemanjá.

Mas toda vez que venta aqui, na lateral da janela, é como se eu estivesse na casa dela.

Meus marinheiros são desbravadores de ventanias. Minhas ondas são galhos dançantes. A espuma se faz em cada folha que cai.

Sou uma pirata da terra firme.